Refletindo sobre educação

“Cada vez mais a especialização surge como instrumento imprescindível a ser utilizado por cada um de nós no nosso dia-a-dia.”

O Estado, com uma intenção cuja intrínseca bondade não podemos questionar, instituiu a escolaridade obrigatória até ao 12º ano. Pretende com esta medida, dotar a plenitude dos cidadãos nacionais com um leque mínimo de competências e conhecimentos que lhes permitissem crescer, adaptar-se e desenvolverem a sociedade que integram.

No entanto, a realidade evidencia com toda a clareza, que a eficácia desta medida fica muito aquém do minimamente desejável. Por via desta obrigatoriedade legal, os professores e muitos alunos com motivação e vontade de aprender são presentemente confrontados com a presença obrigatória de outros alunos cujo principal intento é nitidamente boicotar a ação pedagógica dos docentes. Acresce ainda, que é o próprio sistema educativo a preconizar que a esses elementos devem ser conferidas todas as atenções, como forma de recuperá-los e torná-los cidadãos conscientes e responsáveis. No entanto, as causas que estão subjacentes a essas posturas desviantes são secundarizadas e não são atacadas e debeladas eficazmente na sua origem. E aos professores continua a exigir-se que sejam mágicos e que através de artes divinas encontrem e apliquem soluções eficazes. Esquecem-se os defensores desta tese, que ao tentarem fazê-lo, os professores estão a descurar os outros alunos que se encontram predispostos a aprenderem e evoluírem. O resultado é óbvio e desolador: os alunos problemáticos não são recuperados, porque as causas não foram anuladas e os alunos motivados não aprendem, porque os esforços dos seus professores estão mais centrados nos colegas com atitudes e comportamentos indisciplinados e desviantes.

Pergunta-se então: que papel deve ter a Escola? Quais os conhecimentos a transmitir? Quais os valores sociais a reproduzir? Quais as capacidades a desenvolver? Quais os comportamentos a incentivar e a modificar? Que métodos pedagógicos devem ser utilizados para esse fim? Que currículos devem ser adotados?

Neste sentido, um dos problemas que presentemente se levanta, prende-se com o carácter pedagógico que deve ter a Escola contemporânea: Generalista ou Especialista? Deveremos saber de tudo um pouco, ou tudo de pouco?

As necessidades atuais não se compadecem com conhecimentos superficiais sobre um diverso e variado leque de assuntos. Cada vez mais a especialização surge como instrumento imprescindível a ser utilizado por cada um de nós no nosso dia-a-dia. Cada pessoa reúne no seu seio, um conjunto de dons e aptidões que devem ser explorados e rentabilizados no sentido de lhe proporcionar competências nos mais diversos domínios, tais como: no pessoal, no familiar, no âmbito social, no cultural, no político e no profissional.

Quero no entanto realçar que não se deve depreender das minhas palavras que a vertente generalista deverá ser abolida, muito pelo contrário. Esta deverá estar na base de qualquer currículo, digno desse nome.

Contudo, sou de opinião que mesmo na fase generalista do ensino, o sistema deveria possibilitar que os alunos fossem tendo noção e consciência das suas naturais aptidões e vocações. Tal poderia ser feito com um acompanhamento regular de psicólogos e especialistas afins que ao longo desta fase, iam aquilatando e detetando os reais interesses e necessidades dos discentes, no sentido de os auxiliar na escolha mais gratificante do seu futuro académico e profissional. Julgo que esta medida acarretaria algumas vantagens significativas.

Por um lado, estes psicólogos, sendo conhecedores das reais expectativas e desejos dos alunos, seriam elementos fundamentais a serem tidos em conta na elaboração dos currículos da fase especialista do ensino.

Por outro lado, os próprios alunos saberiam que o sistema de ensino, numa fase mais avançada, lhes iria possibilitar a concretização dos seus legítimos anseios. Que maiores motivações poderão ter os alunos do que esta? Muito provavelmente, o facto de saberem que o sistema de ensino lhes possibilitava um futuro profissional que os realizava, determinaria que seriam eles próprios a encararem a Escola como uma Instituição essencial no seu processo de amadurecimento e não como uma fatalidade e obrigação. Estariam assim criadas as bases para os alunos sentirem a necessidade da aprendizagem, traduzida no gosto por aprender. Desta satisfação, dependerá todo o sucesso escolar, pois não há pedagogo que atinja os seus objetivos se os seus alunos não quiserem aprender. O Ensino só é pleno se ao trabalho do professor, corresponder o empenhamento do aluno, conjugados em equipa unida e articulada.

Ao proceder deste modo, o Estado impondo a obrigatoriedade da frequência escolar, estará de forma responsável a facultar uma formação escolar abrangente, na qual todos os alunos encontrarão um currículo que os alicie. Quem não quiser, não deverá ter a obrigação de ser sujeito a uma aprendizagem que rejeita, nem o direito de entravar e obstaculizar o esforço e empenho de docentes e discentes. Se assim for, estará o sistema educativo a contribuir para a génese e formação de cidadãos maduros, conscientes dos seus deveres e direitos, condição essencial para a estruturação de uma Sociedade digna desse nome!

Artigo de opinião publicado na edição impressa do JM de 21/11/16 e que pode ser consultado aqui.