Liberalização da linha aérea

Os agentes políticos (governantes e deputados), no decorrer da sua ação programática e propositiva, supostamente devem de o fazer enquadrados pelas balizas dos ditames ideológicos que norteiam e regem os partidos políticos dos quais são provenientes.

 No entanto, por vezes (in)conscientemente apresentam propostas que colidem objetivamente com os pilares e alicerces ideológicos pelos quais se guiam. Um exemplo concreto desta minha afirmação, foi a promessa/expetativa criada por Miguel Albuquerque na campanha eleitoral para as Regionais de 2015, na qual foi dito que nenhum madeirense residente pagaria mais de 86 euros e nenhum estudante mais de 65 euros para se deslocar por via aérea ao continente português.

Ora bem, esta intenção governativa, sendo aplicada na sua plenitude colide com as regras da também defendida liberalização da linha aérea Madeira-Continente, senão vejamos:

Antes de 2008 a linha aérea Continente-Madeira não estava liberalizada e existiam obrigações de serviço público. Nesse contexto, os preços a pagar pelos residentes e estudantes na/da Madeira eram definidos e tabelados. Esses valores poderiam ser alterados numa lógica de adequação às reais necessidades dos passageiros madeirenses por decisão política dos governantes nacionais/regionais.

Com a liberalização da linha aérea em 2008, apesar da “exigência da manutenção das obrigações de serviço público”, a verdade é que o preço médio das viagens subiu grandemente. Numa linha aérea liberalizada, gestor que se preze irá implementar um tarifário que lhe proporcione o maior lucro possível. Neste pressuposto, quando lhe confrontam com um modelo de subsidiação no qual preços até ao limite de 400 euros serão reembolsados aos passageiros, obviamente que a tentação para nivelar as tarifas por esse montante é enorme. A companhia aérea sabe que viagens a 400 euros serão sempre vendidas, pois o Estado irá reembolsar os passageiros. Portanto, querer exigir aos gestores tarifas mais baixas neste contexto é pura ingenuidade, para não dizer outra coisa, de quem assim procede.

​A alteração que se reivindica de os passageiros só pagarem 86 ou 65 euros no momento da compra da viagem, enferma do seguinte problema: esta condição sendo aplicada a todas as viagens, implicará que o Estado ainda tenha que injetar mais dinheiro em reembolsos às companhias aéreas, uma vez que o passageiro naturalmente irá adquirir a viagem em função das suas necessidades de mobilidade, não se preocupando com o valor do preço da mesma (essa será uma preocupação do Estado). E neste contexto, as companhias aéreas ainda poderão aumentar ainda mais as tarifas, uma vez que serão sempre ressarcidas pelo Estado). A não ser que as viagens disponíveis a 86 e 65 euros sejam restringidas a determinados voos. Mas se assim for, volta-se à origem do problema: continuarão a existir viagens acima dos 86 e 65 euros, situação que foi prometida eliminar.

Na sequência desta situação, há quem já defenda a adoção do modelo aplicado nas vizinhas ilhas Canárias, no qual se pretende que as pessoas reservem com mais antecedência, que as companhias aéreas não se aproveitem inflacionando os preços e que possibilite aos residentes solicitarem o reembolso imediatamente após a reserva ou em alternativa pagarem unicamente a tarifa correspondente através de um desconto variável calculado percentualmente. A diferença nesta proposta é a de que o valor pago pelo passageiro, tendo desconto, nunca tem um limite superior nos moldes em que foi prometido por Miguel Albuquerque.

Moral da História: querer ter uma linha liberalizada e simultaneamente um modelo de subsidiação à mobilidade com uma tarifa limitada por valor fixo acaba por na prática se tornar uma enorme utopia inexequível. O melhor dos dois mundos, neste caso em concreto, é simples e ideologicamente impossível! JM

 

 

publicado em JM-madeira.pt