Charter e natureza humana...

Na próxima sexta-feira chegarão à Madeira os dois voos fretados pelo Governo Regional no âmbito da Operação Charter destinada aos estudantes universitários madeirenses matriculados em instituições de ensino superior no Continente

Esta operação já fez correr muita tinta e foi geradora de muita polémica como resultado dos seus contornos. Desde os estudantes abrangidos, passando pelas agências de viagens, pelos agentes políticos, bem como comentários nas redes sociais e blogosfera, muitas e diversas foram as reações suscitadas. Nelas estão bem patentes as naturais contradições e idiossincrasias da nossa bem complexa natureza humana, senão vejamos:

O pressuposto inicial subjacente a esta operação charter, é permitir aos estudantes mais carenciados a possibilidade de virem passar as férias da Páscoa à Madeira pagando unicamente o valor de 65 euros, sem terem de efetuar à cabeça o pagamento integral da viagem e sendo posteriormente reembolsados do mesmo. Este pressuposto foi logo desvirtuado no primeiro voo, uma vez que muitos foram os não carenciados, que sendo clientes habituais de determinadas agências de viagens, fizeram valer esse estatuto junto das mesmas e pré-reservaram as respetivas viagens, não tendo assim de estar nas filas que se formaram durante a noite antecedente à manhã em que, supostamente, iriam começar a ser vendidas as viagens. Esta atitude de quem, não precisando, não se coibiu de comprar viagens a um preço acessível, coartando essa possibilidade a quem efetivamente precisava, sendo legal não deixa contudo de ser eticamente reprovável e evidenciadora de um certo egoísmo social.

Eticamente condenável foi também a reação posterior das agências de viagens ao anúncio do segundo voo fretado, o qual foi vendido na Loja do Cidadão. Lamentável a postura adotada de “virgens ofendidas” na qual criticaram a decisão governamental de não vender as viagens através das mesmas. Puseram-se a jeito para essa decisão, uma vez que ao permitirem as pré-reservas no primeiro voo, desvirtuaram grandemente o verdadeiro propósito do mesmo, beneficiando quem não tinha carências nem insuficiências económicas.

​Ainda no que tange ao primeiro voo fretado, no decurso do debate mensal com o Presidente do Governo Regional realizado em fevereiro, foi colocada a seguinte questão pelo grupo parlamentar do BE: “A viagem Lisboa-Funchal será a 23 de Março às 20h, de forma a permitir que os estudantes que residam fora de Lisboa tenham tempo para chegar ao aeroporto e embarcar. O regresso será a 1 de abril às 22h30m, de forma a permitir que os estudantes possam passar o Domingo de Páscoa com as respetivas famílias. Não colocando em causa a bondade inerente à hora do regresso, gostaríamos de chamar a atenção para o seguinte: o fim da viagem de regresso será por volta da meia-noite. Assim, todos os estudantes residentes fora de Lisboa, terão de utilizar o comboio ou expresso rodoviários durante a madrugada (se os houver). Nesse caso, questionamos se viajar nesses meios de transporte após a meia-noite será uma opção segura e aceitável. Se esses transportes não existirem (durante a noite), os estudantes terão de pernoitar no aeroporto de Lisboa. Assim, considerando estas possíveis condicionantes, não seria mais sensato providenciar para que a viagem de regresso seja realizada na manhã do dia 2 de abril (a partir das 8 ou 9 horas) de forma a permitir que todos aqueles que residam fora de Lisboa possam se deslocar para as respetivas cidades de acolhimento em horas mais apropriadas e seguras?”. A formulação desta questão suscitou algumas reações de gozo por parte da bancada parlamentar do PSD. No entanto, posteriormente e curiosamente verificamos que o regresso a Lisboa do segundo voo fretado irá agora se efetuar a horas decentes e seguras.

Outra reação verificada nas redes sociais e blogosfera, foi a de algumas pessoas se revoltarem e indignarem com o facto de enquanto contribuintes estarem a “pagar” para um conjunto de meninos privilegiados (por serem estudantes universitários) virem à Madeira na Páscoa. Esquecem-se estes “cidadãos indignados e revoltados” que mais privilegiada será, essa sim, a sociedade que mais quadros superiores e qualificados tiver no seu seio. E portanto, todo o investimento público feito na formação e qualificação desses jovens, representará uma mais-valia para o futuro bem-estar integral de todos os cidadãos.

Enfim, decididamente o egoísmo, a inveja, a ganância e a estupidez ainda continuam infelizmente a caracterizar a natureza humana! 

 

 

Publicado em jm madeira