Mulheres da Madeira em luta

Logo depois do 25 de Abril saíram à rua para reivindicar e não mais pararam. A História em 300 fotografias

Guida Vieira e Assunção Bacanhim assinam ‘As imagens falam por ELAS’. As duas sindicalistas andaram envolvidas nas lutas das mulheres desde o 25 de Abril. Agora reuniram numa obra imagens dos momentos mais significativos de um longo percurso partilhado, que levou à conquista de direitos. A obra pretende constituir memória futura para uma geração que nasceu com a liberdade assegurada. A apresentação da obra editada pela UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta é hoje, às 18 horas, no Salão Nobre da Câmara Municipal do Funchal.

Do Sindicato dos Bordados, ao Departamento de Mulheres da União dos Sindicatos, fundado em 1979, passando pela Comissão de Mulheres da CGTP - Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses, as duas autoras fizeram o que puderam para dar outra força ao sexo feminino. Pelo caminho, foram recolhendo registos fotográficos que agora apresentam.

“Logo a seguir ao 25 de Abril ninguém se preocupava em recolher imagens. Ficámos muito limitadas nos primeiros anos”, confessa Guida Pereira, hoje com 76 anos. A partir de 1976 conseguiram reunir um conjunto de fotos de lutas importantes. Nesta obra está a das bordadeiras de casa, que trouxe mulheres de toda a ilha ao Funchal, numa altura em que o campo ainda era longe; uma luta “bastante original”, como descreve a coautora, com retratos das primeiras manifestações no Funchal, em 1979.

Está a igualmente a luta das operárias dos têxteis da Zona Franca, que começaram em Machico e no Caniçal e chegaram ao Funchal. “A primeira manifestação à porta da Quinta Vigia, em janeiro de 1997, foi feita pelas mulheres operárias do Caniçal”, recorda. Queixavam-se do desemprego promovido pelas várias empresas estrangeiras, que se tinham instalado na Região e que abandonaram a ilha, quando terminou a isenção de impostos.

A participação em ações de formação, plenários sindicais, nas lutas do 1.º de Maio, nas manifestações e em atividades culturais constam da obra, acompanhada apenas de alguns versos de Conceição Pereira, outro dos rostos da luta feminina na Madeira, hoje com 80 anos. O livro integra as comemorações de quatro décadas de UMAR e inclui igualmente referências ao trabalho desta organização.

“Queremos fazer uma ponte com o passado, a memória dessas lutas com o presente, que é a continuidade do trabalho que hoje se faz em moldes diferentes”. A palavra luta é estranha às mulheres de hoje, reconhece. É bem diferente de quando começaram na rua a exigir reconhecimento, igualdade, liberdade. Guida Vieira diz que já não há tanta mobilização, as mais novas colocam noutros patamares as suas reivindicações. O importante, recorda, é participar. “Às vezes a forma é secundária. O que interessa é não se acomodar”. “O que é preciso é reagir, participar, se sentir ativa. Se as mulheres se acomodarem, as coisas vão voltar para trás. Isto é da História”.

O livro pretende criar um registo de memória da participação das mulheres, para que no futuro fique a prova de que as mulheres na Madeira souberam agarrar na liberdade, no fundo naquilo que foi dado com o 25 de Abril. “Nós logo a seguir ao 25 de Abril não tínhamos nada. Nós não tínhamos contrato coletivo de trabalho, não tínhamos salário mínimo, não tínhamos subsídio de férias, subsídio de Natal, planeamento familiar. Nós não tínhamos acesso a nada. É natural que quando nós não temos nada, nos mobilizarmos para ter as coisas.”

Com a liberdade, direitos estabelecidos e numa nova era, o desafio é assegurar o cumprimento dos direitos, nesta conjuntura de precariedade do trabalho e desemprego.

Um projeto para prémio

Inicialmente as fotografias foram compiladas para o Prémio Maria Aurora 2016 promovido pela Câmara Municipal do Funchal. Não venceu. Como as autoras tinham o trabalho feito e outras pessoas consideraram importante o conjunto, incentivando mesmo a publicação, Guida Vieira e Assunção Bacanhim conjugaram a edição com os 40 anos da UMAR.

O livro será vendido por 17 euros, o custo de produção, seria muito mais se fosse para contabilizar o trabalho voluntário. As duas autoras recorreram a um empréstimo para o editar.

‘As imagens falam por ELAS’ pode ser adquirido hoje na apresentação ou depois na sede da UMAR durante as manhãs e na feira semanal às quintas no Jardim Municipal ou no Jardim Almirante Reis.

Esta primeira edição é de 500 exemplares.

Artigo publiciado em:http://www.dnoticias.pt/impressa/hemeroteca/diario-de-noticias/mulheres-...