Cumplicidades e pântanos
Estou um bocadinho farta de estratégias erróneas ou demasiado calculistas só para dizer que quem tem dúvidas, ou critica, quer assaltar, quer maldizer, quer maltratar ou ofender quem está no poder. À partida, quem vem para a praça pública fazer acusações sobre as intenções, seja de quem for, quer, objetivamente, condicionar as opiniões preferindo o pântano onde tudo parece estar a correr sobre rodas, e afinal, é como um baralho de cartas, que a qualquer momento pode cair.
E isto aplica-se a muitas situações na sociedade madeirense. No Governo e segurança social, e até muitas associações, que perante a denúncia da morte de 9 mulheres por violência doméstica e de género, preferem falar de outros temas, para disfarçar esta tragédia do século XXI que nos bateu à porta em 2017. Preferem fingir que não é nada com eles/as em vez de pararem para pensar, no que está a falhar, para que isto nos tenha acontecido.
Mudar a mentalidade de posse machista deve ser uma luta de toda a sociedade. Bastava uma morte ou uma queixa para nos fazer pensar que algo está mal e que é preciso agir, e reagir, antes que mais desgraças aconteçam. Senti muita vergonha perante o silêncio cúmplice desta tragédia que nos devia colocar de luto este ano.
Aplica-se também aos coletivos que não suportam quem tem opiniões diferentes. Que fazem chantagem, que espalham medos e mentiras só porque surgem críticas, novas ideias, novos autores, e novas formas de intervenção. Que impõem o seu ponto de vista e as pessoas de quem gostam, mesmo que não tenham mérito próprio, passando inclusive por cima de quem sempre deu o máximo pelo coletivo. A vida não é estática, e o que resultou ontem, hoje pode já não resultar.
Dizemos que temos que viver um dia de cada vez e ir adaptando a nossa vida a essa ideia. Mas, quando se trata de um coletivo, podemos planear, a curto e médio prazo, responsabilizando várias pessoas pelo que for decidido. Afirmar outros personagens, pensar sempre que acima das figuras está o coletivo e que esse não pode “morrer”. E no trabalho coletivo, Todas e Todos contamos, se tivermos organizados/as para trabalhar em prol dos nossos ideais.
Foi assim que aprendi em todos os coletivos que tenho integrado em toda a minha vida militante. Já passei por muitos mas, felizmente, tive sempre o cuidado de sair, quando senti que podia fazer outra coisa noutro lugar, e que chegava a altura de outras pessoas avançarem. Não estar agarrada a nada, mas não perder o sentido social e interventivo, é o meu lema. Hoje intervenho no trabalho autárquico do meu Concelho e no trabalho feminista e em prol da igualdade de género. Gosto do que faço e quando sentir que devo passar o testemunho, não vacilarei.