Constatações autárquicas...
A 1 de outubro, os eleitores portugueses terão, mais uma vez, a oportunidade de escolherem os seus representantes nos órgãos autárquicos dos respetivos concelhos de recenseamento.
Este facto, suscita-me, enquanto cidadão eleitor e ator político algumas reflexões, originadas por algumas constatações que tenho vindo a cimentar, fruto da observação diária efetuada aos diversos comportamentos e atitudes das pessoas face às referidas eleições. Ei-las:
Desde logo estas eleições revestem-se de uma característica própria que as diferencia das restantes. Nesta eleição, todos nós somos chamados a sufragar candidaturas para três órgãos autárquicos: Câmara Municipal, Assembleia Municipal e Assembleia de Freguesia. Assim, a cada eleitor no momento do voto, é-lhe entregue não um mas três boletins de voto, para assim poder votar para cada um dos órgãos acima indicados. Este facto, passados que são mais de quarenta anos sobre as primeiras eleições autárquicas, ainda suscita junto de alguns eleitores surpresa e estupefação. Esta situação torna evidente que esse conjunto de eleitores não têm noção nem consciência do que efetivamente está em causa nas eleições autárquicas; que existem três órgãos distintos na estrutura de um município; que as candidaturas existentes para cada um dos órgãos poderão ser diferentes; que um determinado partido poderá apresentar candidatura à Câmara, mas já não o fazer para a Assembleia Municipal. Ou seja, estas “condicionantes” e especificidades implicam por parte do eleitor uma atenção, esclarecimento e informação adicionais, no sentido de poder votar de forma mais consciente e esclarecida.
Outro aspeto que já tive oportunidade de constatar, é que é nesta eleição em particular que a elaboração das listas é mais difícil. Efetivamente, a dificuldade começa logo pelo número de candidatos que são necessários para um partido concorrer a todos os concelhos. A título de exemplo, na RAM, quem pretender concorrer a todas as Câmaras, Assembleias Municipais e de Freguesia dos 11 concelhos e 54 freguesias, tem de ter nas suas listas mais de 800 pessoas (considerando só os candidatos efetivos). Verifica-se assim, que do universo partidário existente, poucos são os partidos que tenham um número de militantes suficiente para compor as respetivas listas. A solução passa assim, inevitavelmente, por “recrutar” cidadãos independentes (não filiados partidariamente). E aqui, perdoem-me a expressão, “é que a porca torce o rabo”. Por cada cidadão que aceita fazer parte da lista, seguramente existe um número exponencialmente superior que se recusa a fazê-lo. Muitas vezes os partidos são acusados, pelos mesmos cidadãos, por apresentarem sempre os mesmos candidatos, ou por terem candidatos “fraquinhos”. Ignoram ou esquecem esses críticos que se isso acontece é precisamente porque existem cidadãos que gostam muito de opinar e criticar a classe política, mas quando chamados a assumir responsabilidades e contribuir ativamente para um arejamento e refrescar da mesma, encolhem-se e “fogem com o rabo à seringa”. Não me esqueço de uma vez ter sido confrontado por uma colega de profissão com a sua indignação por numa determinada freguesia o meu partido se propor apresentar como cabeça de lista uma pessoa, que no entendimento dessa minha colega não reunia o perfil mais adequado, e questionava-me se não tínhamos alguém “melhor”. Respondi-lhe de imediato, propondo a essa minha colega, que se ela quisesse poderia ela própria assumir essa candidatura e melhorar substancial e significativamente a qualidade da mesma. A reação, imediata e pronta, foi recusar logo essa proposta. Como se verifica, ativismos de sofá e nas redes sociais é o que não falta. Agora vir ao terreno dar o corpo ao manifesto, já não é para qualquer um.
Esta realidade leva a que haja dentro dos partidos, a tentação de, na procura de concorrer ao número maior de concelhos e freguesias, colocar pessoas a encabeçar as listas que notoriamente não reúnem o perfil mais adequado. Esta postura é um erro, pois concorrer com candidatos impreparados, sem propostas e soluções e desconhecedores da realidade local torna-se contraproducente e desprestigiante para quem se apresenta desta forma ao eleitorado.
Portanto, o que se pede e deseja é que haja bom senso na feitura das listas por parte dos partidos; e moderação e contenção nas críticas dos cidadãos à composição das mesmas, quando muitas das vezes esses mesmos cidadãos não têm a coragem nem a nobreza cívica de se chegarem à frente para corporizar e protagonizar as mudanças que tanto almejam!
Artigo publicado em www.jm-madeira.pt