Saudades e realidades estranhas
Faz hoje quatro anos que a solidão invadiu a minha vida. Depois de 36 anos de vida em comum, tu partiste. Têm sido tempos difíceis, em todos os sentidos. Não é fácil estar a querer comentar contigo tantos assuntos do nosso quotidiano, particularmente o político. São tantas as novidades e os acontecimentos que tenho a certeza que a tua opinião seria muito importante. Mesmo com as saudades imensas, neste dia inesquecível, no pior sentido do termo, vou opinar sobre alguns desses acontecimentos, até porque a vida não para enquanto andamos por aqui e conseguimos exprimir em palavras algumas das coisas que sentimos.
Pensei falar de alguns assuntos mais debatidos, como a TAP e a mobilidade, o próximo Orçamento do Estado e as reivindicações mais importantes a nele ficarem vertidas, mas decidi deixar, para os mais entendidos nas matérias, esses assuntos. Pelo menos por agora...
Tenho reparado que o Governo Regional tem-se desdobrado em ações diárias com “remédios” para todos os problemas da Região. Até vi uma ação de distribuição de dinheiro pelas empresas, algumas das quais pagam sempre com atraso os salários aos/às seus/as trabalhadores/as, chantageando permanentemente com insolvências e não apresentando qualquer benefício visível em relação aos apoios que recebem. Basta ver algumas das placas afixadas no exterior das mesmas, em relação a esses apoios, e nada explicam sobre os mesmos. É caso para perguntar: para que servem os dinheiros comunitários? São para criar e fixar emprego, ou são para tapar buracos permanentes de alguns empresários que estão sempre a culpar quem trabalha dos seus problemas?
Na saúde, parece que tudo está a andar num mar de rosas, com tantos seminários nacionais e internacionais. No entanto, continuamos a ter longas listas de espera, até para situações que poderiam ser resolvidas de forma rápida, mas pelo facto de não serem, acabam por se tornarem mais graves. Não é compreensível que uma pessoa com um problema num joelho há anos, que agora já afetou o outro, esteja à espera de uma cirurgia há 14 anos, estando já a ficar deficiente com dores permanentes. E outra, que já foi operada duas vezes, ao mesmo problema, e não o viu o resolvido, esteja há meses à espera de outra intervenção, no mesmo local, estando cada vez pior e agora sim com maior sofrimento. Estes dois exemplos são o dia-a-dia de milhares de pessoas, que entopem as listas de espera do Sistema Regional de Saúde, que não responde e fica indiferente ao sofrimento dos/as seus/suas utentes. Há coisas inexplicáveis...
Saindo um pouco da nossa estranha realidade, gostaria de falar do perigo que Bolsonaro, candidato a presidente do Brasil, representa para a humanidade. Sabemos que é um machista, e não só, e isso ficou claro com o movimento #EleNão, mas muita gente não sabe que ele defende a esterilização dos pobres para combater a miséria, dizendo que “pobre só serve para votar e ter na mão um diploma de burro”. O filho dele, que é vereador, vai mais longe e defende “uma bolsa de família só para quem se submeter a vasectomia ou laqueação a partir dos 21 anos”. Neste momento, no Brasil, isso só é possível a partir do 3º filho e com mais de 25 anos.
Depois de tudo o que tem acontecido no mundo, se este ser for eleito presidente do Brasil, vamos ficar ainda mais pobres nesta democracia que já está tão fragilizada. Espero poder festejar a sua derrota.
(publicado no Diário de Notícias da Madeira a 3 de outubro)