O que uma mão dá a outra não vê
O que se passou, e passa ainda, com a chamada solidariedade para com as vítimas dos incêndios, na maior parte das vezes, é o oposto deste critério. Muita gente quer dizer na televisão o que deu, o que fez, as noites que não dormiu, os riscos profissionais que correu, até promovem festas onde o esquema é igualzinho a outras tantas festas que por aí abundam, onde os aparelhos do costume se impõem, não vá o diabo tecê-las e serem outros a ficarem com os “louros” nos votos para o ano.
Há uma coisa que esta gente não aprende é que o povo não é burro. Sabe que muita gente anónima deu o que pode, correu aos postos de emergência e contribuiu de todas as formas e feitios para ajudar de imediato quem mais necessitava. Essas pessoas, que também depositaram dinheiro nas contas solidárias, fizeram, com sempre aprendi, “não digas à tua mão direita o que deste com a esquerda”. Isso é o que eu chamo a verdadeira solidariedade que deve continuar como um valor de cultura profunda, da nossa forma de sermos seres humanos, completos e felizes.
Outra coisa que fui aprendendo, até como sindicalista, é que no mundo das profissões existem diferentes graus de responsabilidade e se toda a gente cumprir com a sua, tudo corre melhor, ninguém se “atropela” e assim o sucesso do trabalho é garantido.
Também aprendi que, de uma forma ou de outra, toda a gente é necessária, uns têm um papel mais de destaque numas situações, conforme o seu grau de especialização ex: Para apagar os incêndios são os bombeiros, bem dirigidos pelo seu comando hierárquico, mas para varrer e limpar as ruas, depois da festa do mercado, são os trabalhadores do ambiente, também dirigidos pelo seu Departamento, que são fundamentais para gozarmos de uma cidade limpa, para vivermos o Natal e recebermos, de cara lavada, quem nos visita.
É verdade que uma e outra situação são diferentes. Os riscos não são iguais, por isso mesmo é que defendo que as profissões de risco, como os bombeiros e outros profissionais equiparados, no risco, deveriam ter direito, para além de um bom ordenado, a um suplemento especial de risco.
Em relação aos dois poderes que estiveram em destaque nesta situação difícil que vivemos. O Municipal cumpriu o seu papel mas os meios foram nitidamente insuficientes. Por melhor que sejam os nossos dirigentes e os nossos profissionais, numa situação destas, o Funchal não estava preparado para enfrentar tamanha tragédia. Teve que pedir ajuda Regional, que também não foi suficiente, e quando todos os que seguiam, pela comunicação social em direto, estavam a ver que a situação estava sem controlo, o poder Regional adiou, estupidamente, o pedido de ajuda ao País.
Esta verdade é indesmentível, independentemente das nossas simpatias por um ou outro dos poderes. Esta falha grave esteve à frente dos nossos olhos, por isso a famosa frase de que “ está tudo sob controlo” foi tão mal amada e nunca a vamos esquecer.
Foi uma grande tristeza as Pessoas que morreram. E não foram só as anunciadas. Basta ter visto os jornais com os anúncios de funerais, sobretudo de pessoas idosas, logo a seguir aos acontecimentos, para perceber que existiram “danos colaterais” não anunciados. Uma coisa era ter retirado as pessoas dos hospitais de forma calculada, fora de risco eminente, outra foi retirá-las com fumo intenso por todos os lados. Mas mais uma vez o silêncio cúmplice do “esteve tudo sob controlo” predominou.
Nunca gostei de situações dúbias, apoio os esforços para reerguer a nossa Cidade e a nossa Terra, faço mesmo votos para que tudo corra bem, mas neste artigo, tinha que registar a minha opinião sobre uma situação que abalou a continuará a balar as nossas vidas durante muito tempo.
Guida Vieira