Mais Bloco - Por uma Educação mais humanista

A presente reflexão resulta da minha participação nas “Novas conferências do Casino – Insularidade e Educação”, uma organização conjunta da Secretaria Regional de Educação e do Diário de Notícias da Madeira, que decorreu no Centro de Congressos da Madeira - Sala de Conferências, no dia 7 de dezembro de 2018.

Considerando a temática relativa aos inúmeros desafios e pressupostos que caracterizam os espaços insulares, procuro abordar as implicações das políticas educativas da RAM no contexto das práticas pedagógicas e, consequentemente, na formação dos cidadãos.

O diagnóstico do estado da educação na RAM, apresentado pelo Secretário Regional da Educação da Madeira, apresenta a nossa região numa situação de enorme complexidade para manter a sua sustentabilidade económica, agravado pela quebra demográfica. Perante a evolução positiva dos indicadores educativos entre o período do Estado Novo e a Autonomia, estranho seria o contrário, nomeadamente taxas de alfabetização, de sucesso e de abandono escolar, e quantidade de  projetos de inovação pedagógica e de intercâmbio/mobilidade com escolas estrangeiras, concluiu que as politicas educativas regionais, no âmbito da sua autonomia politico - administrativa, têm procurado responder pela educação às exigências das competências sociais e do mercado de trabalho.

De facto, os desafios que se colocam à educação obrigam a uma constante adaptação e capacidade de respostas educativas e formativas. Convém, por isso apurar a sua pertinência  e resultados.

O paradigma educativo atual, de carácter eminentemente tecnocrata, mais formativo que educativo, claramente focalizado nas competências exigidas pelo mercado do trabalho, que em muitos casos passa pela emigração, coloca em segundo plano a dimensão humanista da educação, socializadora e construtora da identidade. Assim, o sistema educativo vigente sobrevaloriza as áreas das “ciências exatas”, das línguas e das tecnologias, consideradas mais instrumentais e úteis ao futuro desempenho profissional, cada vez mais incerto.

Será certamente importante a aquisição de competências que formem os cidadãos nas áreas dos idiomas e das novas tecnologias, mas é imprescindível o desenvolvimento da sua autonomia e espírito crítico, permitindo a sua intervenção cívica de forma consciente e responsável.

As práticas pedagógicas, decorrentes do paradigma educativo atual e em conformidade com a carga curricular atribuída a cada área disciplinar, desenvolvem predominantemente situações de aprendizagens que visam a aquisição pelos alunos/formandos de competências necessárias ao seu futuro profissional e subvaloriza as competências relacionadas com respostas ao seu quotidiano, em particular o entendimento do funcionamento da nossa democracia, reduzindo a sua futura capacidade de intervenção cívica, naquilo que nos carateriza como cidadãos de pleno direito.

Assim, sem descurar a componente mais tecnocrata do ensino, o Estatuto Politico -Administrativo da RAM apresenta-se como um instrumento que permitiria um modelo educativo mais diferenciador. Poderia a região apresentar a operacionalização de um paradigma educativo mais humanista, contrariando o paradigma vigente? Haja vontade.

A aquisição de competências socias, que implicam uma experimentação de situações que operacionalizam o espírito crítico, a capacidade de análise e a criatividade na busca de soluções pela descoberta, desenvolve a inclusão e sentido de pertença, dignificando o individuo como elemento estruturante da sua comunidade/grupo.

Parece-me plausível e fundamental implementar políticas educativas que conduzam à necessária criação de massa critica capaz de responder aos desafios cada vez mais complexos, a uma formação que resulte na efetiva aquisição de competências socias, cívicas e políticas, traduzida em cidadãos interventivos e responsáveis.

Só criaremos uma sociedade capaz, criativa e solidária, se cada individuo conhecer a organização política, as competências dos órgãos de poder, o funcionamento da administração, tornando-o capaz de experienciar efetivamente a vivência democrática e a corresponsabilização na tomada de decisões que determinam a evolução da situação social e económica da sua comunidade. O sentimento de pertença, criado pela apropriação do conhecimento do funcionamento da nossa democracia, permitiria encontrar soluções que resultassem da discussão dos diferentes contributos.

Esta aposta de intervenção pedagógica, por si só não estancaria a acentuada redução demográfica. Uma certeza parece-me razoável, o sentido de pertença leva-nos a encontrar soluções criativas e coletivas que visam a estabilidade e sustentabilidade futura num ambiente de paz e progresso, e por outro lado o atual modelo educativo regional permite a exportação de conhecimento sem qualquer retorno do investimento coletivo.

A nossa democracia precisa, urgentemente, de reforçar o currículo escolar na dimensão humanista, cívica e política, sob pena desta ser uma miragem.

A educação em democracia permite escolher entre caminhar para a tecnocracia ou para o humanismo.